Fora do Eixo pulsa a cultura independente em SP
Uma casa que tem feito muito barulho em São Paulo vem chamando atenção da mídia, do público interessado em música e dos agitadores culturais brasileiros. Uma rua pacata do bairro da Cambuci abriga o braço paulistano e sede nacional do coletivo Fora do Eixo, produtor do barulho que tem chamado atenção de gente do Brasil e do mundo.
Numa tarde de quinta-feira, o Portal MTV foi fazer uma visita para entender um pouco melhor do que se trata a movimentação que acontece ali dentro e que eoca para muito longe. A casa recebeu seus primeiros habitantes em 13 de janeiro de 2011 e, no momento, 17 pessoas moram no local. Mas, entre vizinhos, bandas, curiosos, jornalistas e entusiastas da cultura, muito mais gente passa pela casa todos os dias.
Quem nos recebe é a coordenadora nacional de comunicação do Fora do Eixo, Dríade Aguiar, que nos apresenta todos os cantos da casa, mas apenas no andar de baixo. O ander de cima do sobrado é privativo, com acesso apenas para os 17 moradores.
A Brasília do Fora do EixoOs moradores da casa vieram dos coletivos culturais da rede Fora do Eixo de todo o território nacional que, depois de atuar por todo o país, resolveu trazer o Fora do Eixo para "dentro do eixo". O coletivo nasceu há seis anos em Cuiabá (MT), Londrina (PR), Uberlândia (MG) e Rio Branco (AC), cidades geograficamente distantes de Rio de Janeiro e São Paulo – o eixo de cultura efervescente do Brasil.
Por meio da internet, os criadores do projeto se conheceram, mantiveram comunicação e aumentaram o número de agitadores culturais, organizados em diversas cidades do país. Juntos, eles formam um coletivo ainda maior, que se fortalece e dá gás para a produção cultural pensada por eles em diversas frentes, como cinema, teatro, literatura e música, o ponto de maior força. A vinda do coletivo para São Paulo, para o chamado "eixo cultural", veio depois de uma maturação por parte dos coletivos que passaram a ver o coletivo "fora do eixo" intelectualmente falando.
"Como aqui é a sede nacional, podemos concluir que estamos na Brasília do Fora do Eixo", pergunto. "Isso mesmo, aqui é a nossa Brasília, tem gente que defende seus ministérios", afirma Dríade Aguiar, coordenadora nacional de comunicação do Fora do Eixo. "A gente brinca que a música é o nosso Ministério da Saúde, o que tem mais dinheiro, mas mais problema", completa Dríade.
Cada cômodo da casa funciona como uma sala de articulação das atividades do coletivo, como 'comunicação' e 'política e eventos'. Os coordenadores cuidam de projetos fundamentais para a organização do Fora do Eixo, como a música, o Banco Fora do Eixo e a Universidade Fora do Eixo.
Também como acontece em Brasília, as despesas da casa são compartilhadas por todos os pontos coletivos do Brasil, por meio de contribuições a um caixa solidário chamado de Banco Fora do Eixo – o Ministério da Fazenda da casa, uma frente de atuação administrativa que cuida de todo o circuito. "A gente tem um fundo nacional que cada coletivo aplica uma grana e a gente tem que manter essa grana rolando tanto para eles quanto pra gente. Quando um coletivo precisa pagar água e não consegue, pega do fundo e depois, quando puder, devolve", detalha Dríade. Por mês, as despesas da casa em São Paulo giram em torno de R$ 10 mil.
Insistindo na comparação com a capital da nação, além de casa para 17 pessoas, o local funciona como hospedagem solidária para as bandas envolvidas com o Fora do Eixo que passam por São Paulo. Elas vêm para tocar na cidade, em eventos do coletivo ou para outras atividades. Mas todas ficam na casa e encontram um local para repouso na cidade. "Tem banda que adora cozinhar e faz a janta pra gente. A maior concentração de pessoas na casa é no domingo", conta Dríade. Para se ter uma ideia, no dia da visita da MTV, 33 pessoas estavam no local.
VivênciaQuando chegamos, por volta de 15h, o almoço ainda não tinha saído. "Aqui a gente almoça tarde", explica Dríade. "É muita gente, o almoço leva umas quatro horas para ficar pronto e todo dia alguém de uma frente toma conta da produção", explica. A divisão é feita de forma natural, mas com uma planilha de controle. "Mas os gestores se auto-indicam para isso", destaca Dríade.
Mas, como toda casa, alguns lugares são especiais para receber as visitas, como é o caso da sala de TV. "Aqui a gente assiste TV, faz reunião com os moradores da casa, com as bandas, os parceiros, como um lugar para as pessoas ficarem mais à vontade", diz Dríade.
Por ter representantes de vários coletivos do Brasil, todos usam bastante a internet para compartilhar tudo o que acontece pelo país. "Como aqui é a sede nacional de representantes do Fora do Eixo, a gente usa de vários meios para integrar os movimentos, desde ficar o dia inteiro na internet ou visitar os pontos pessoalmente", afirma Dríade. A casa em São Paulo recebe membros de coletivos de todo o país, que ficam cerca de 4 a 10 dias no local para promover debates sobre suas atuações localmente, compartilhando informações com os moradores.
Quem mora na casa tem dedicação exclusiva ao coletivo. Dríade conta que está há dois anos voltada ao Fora do Eixo. Mas não é assim com todo mundo. Pelo Brasil, nem todas os membros de todos os coletivos trabalham em dedicação exclusiva, mas cada coletivo determina como acha melhor a inclusão de seus integrantes. Como a maioria é jovem, boa parte divide o tempo entre o coletivo e afaculdade. Pelo Brasil, muitos têm sede que funciona como moradia, outros apenas como sede em formato de escritório, outros ainda sem sede.
Todos, ou boa parte deles, se encontram no Congresso Nacional do Fora do Exieo, que acontece anualmente. Em 2011, São Carlos será sede do evento, antes da realização do festival Contato, quando eles têm previsão de chegar a 100 pontos coletivos. "Há uma votação em assembléia geral para decidir se o ponto passa a ser integrante do coletivo", explica Dríade.
"Todo dia tem uma banda na nossa casa"
A principal frente de atuação do Fora do Eixo é a música, com apoio a bandas, realização de eventos e produção efervescente. Dezenas de bandas têm parceria com o coletivo, que ajuda na divulgação de seus trabalhos via internet e na participação em turnês e festivais Brasil a fora, nas rotas dos coletivos.
A principal frente de atuação do Fora do Eixo é a música, com apoio a bandas, realização de eventos e produção efervescente. Dezenas de bandas têm parceria com o coletivo, que ajuda na divulgação de seus trabalhos via internet e na participação em turnês e festivais Brasil a fora, nas rotas dos coletivos.
Funciona assim: uma ou algumas bandas saem em turnê por uma rota determinada, passando por algumas cidades, às vezes por alguns Estados. Semana passada, começou a turnê dos cariocas do Autoramas com os chilenos da Perrosky, que saíram de Goiás e terminam a turnê em São Paulo, passando por seis Estados. Todas seguem juntas e, por cada cidade que passam, são recebidas por um coletivo para tocar nas 'Noites Fora do Eixo'. Além disso, as sedes dos coletivos recebem as bandas nas hospedagens solidárias, da mesma maneira como acontece na Casa de São Paulo.
Além dos shows 'avulsos', cada coletivo ainda produz um festival anual, o Grito Rock, que acontece sempre no mês de fevereiro, contando pelo menos 80 festivais realizados no Brasil por ano. Em São Paulo, as bandas ainda contam com um espaço diário de show, o programa Ao Vivo na Casa, que acontece todos os dias, às 16h e apresenta uma banda tocando no pub da Casa, com show transmitido pela internet. "Hoje quem está aqui fazendo um som é a The Salad Maker, mas todo dia tem uma banda na nossa casa", explica Dríade.
Domingo a atividade é ainda maior, com o projeto Domingo na Casa, quando o coletivo abre a casa para o público entrar de graça e curtir o show de sete bandas. Não só o ingresso é grátis, como tem bebida e comida gratuita para todo mundo. Quem quiser, colabora com um caixa solidário. Desde a estreia do projeto, cerca de 56 bandas já passaram por ali. A ideia é fazer algo bem livre, em que as pessoas se sintam mesmo em casa. Com isso, tem gente que vai pra curtir as bandas, a casa, encontrar os amigos ou até trocar roupas no Brechó solidário que acontece na sala principal.
Com tantas bandas, tanta gente passando pela casa, a pacata vizinhança da Cambuci começou a reclamar do local. Com o tempo e uma política de boa vizinhança, de apresentação para os moradores ao redor, os vizinhos passaram a frequentar a casa todos os domingos, de tão integrados ao local.
Modelo e organização cultural pós-internetA organização entre os integrantes da Casa Fora do Eixo é algo que impressiona, tamanha facilidade com que as informações ficam organizadas e facilmente dispostas pela casa. Em uma parede, é possível localizar todas as bandas vinculadas ao Fora do Eixo, os pontos de envolvimento dos coletivos de todo o Brasil, o tipo de serviço que eles prestam e as rotas que as bandas podem percorrer pelo país nas turnês.
A parede é só um exemplo mínimo do modelo de organização. Com uma rede enorme de pessoas envolvidas e colaboradores, eles criaram até uma moeda especial e paralela, o Fora do Eixo Card. A idéia da moeda é trocar serviços entre os envolvidos na rede, como moeda financeira de eventos, produções e de qualquer setor que o circuito atue. Todo mundo pode contribuir e oferecer algo, só não vale trocar por dinheiro. Para se ter uma ideia do alcance da moeda, toda a estrutura de som do pub da Casa é fornecida pela empresa Cena Produções através dos cards.
Mais que uma casa em que produtores culturais fazem barulho na vizinhança, a Casa Fora do Eixo é a consolidação do projeto de uma galera que entendeu que os novos paradigmas da divulgação e produção de cultura no século 21 é muito mais complexo que o modelo pré-internet pregava. As bandas, produtores, assessores, jornalistas e o público estão há alguns anos, todos juntos, tentando entender como vai ser tudo isso daqui pra frente.
O Fora do Eixo parece ter encontrado um modelo completo e bem sucedido de difusão cultural. Se está certo ou errado, o tempo dirá. Até agora, o balanço dos seis primeiros meses de atuação da casa em São Paulo é positivo. Eles realizaram 150 shows, 15 turnês e hospedaram mais de 300 pessoas. Enquanto isso, a gente tenta te contar tudo que eles fazem. Mas é impossível contar tudo numa reportagem, você precisa conhecer a Casa Fora do Eixo e os coletivos pelo Brasil.
Você pode visitar a Casa Fora do Eixo depois de conhecâ-la noPortal MTV. O endereço é Rua Scuvero, 282 - São Paulo. Entre no site da Casa e saiba como chegar.
http://mtv.uol.com.br/musica/fora-do-eixo-pulsa-a-cultura-independente-em-sp
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